pdf Etica da Experimentação com Animais
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A questão que aqui nos ocupa é objeto de um debate acalorado. A controvérsia a respeito da ética da experimentação com animais (daqui em diante, apenas "experimentação animal") não gira em torno do valor do seu fim (promover a vida/saúde humana), mas, em vez disso, reside na legitimidade dos meios para se atingir esse fim (pelo uso de animais). Entretanto, a despeito da rivalidade fortemente pautada entre a comunidade biomédica e os pensadores da defesa animal (chamados aqui de "animalistas") no que tange ao uso do modelo animal, há alguns pontos de acordo entre as partes. Os pontos de convergências seriam os seguintes: poucas pessoas negariam que o fazer ciência consiste em um empreendimento humano fundamental e necessário, e que é devido à ciência biomédica que há menos sofrimento e morte (humana) no mundo. Poucos cientistas negariam que, se a pesquisa com animais acaba por prejudicar tais criaturas e se seu propósito é a melhora da vida humana, o tema, por sua natureza, levanta questões éticas. Poucos pesquisadores também diriam que a palavra "sofrimento" não se aplica ao reino animal. Não é por outra razão que as pessoas se horrorizam ao ver animais vivos com cabeças abertas, grampos no corpo e coisas do gênero. Por fim, poucos discordariam que a promoção da vida/saúde humana é uma tarefa extremamente importante. Sobre este pano de fundo, cabe agora situar o terreno onde se dará a análise empreendida a seguir. Podemos dizer que o debate a respeito da ética da experimentação animal envolve dois fatores determinantes: (i) Validação empírica dos argumentos científicos. (ii) Diferenças de premissas éticas.
O foco deste ensaio ficará restrito ao segundo desses dois tópicos. Em outras palavras, ele passará ao largo da tese de que a pesquisa em animais produz conhecimento valioso, cuja aplicação ao caso humano pode ser generalizada, ou, ao contrário, se o modelo animal é uma representação cientificamente inadequada do que poderia ocorrer conosco. Portanto, a análise não se debruçará sobre os dados estatísticos que, supostamente, dão apoio à pesquisa (segundo os pesquisadores) ou a derrubam como modelo útil na investigação biomédica (segundo os animalistas). Trataremos, em vez disso, apenas dos marcadores de natureza ética dessa discussão.1 Como na maioria dos debates sobre as diversas áreas a respeito das quais a Ética Animal teria algo a dizer, encontraremos uma coleção de posições aparentemente irreconciliáveis, cujos adeptos quase sempre as tomam como verdades autoevidentes e irrefutáveis. Ocorre que muitos dos pontos que perpassam essa discussão estão implícitos, sejam eles de concordância ou de discordância. Este ensaio não pretende incendiar esse debate com novos argumentos, mas, antes, trazer alguma clareza a ele, iluminando os pontos cegos do tema e identificando as premissas subjacentes às divergências de opinião. O objetivo aqui é fornecer um mapa filosófico dessa discussão em benefício daqueles que se acham envolvidos nela, de uma forma ou de outra. Dito isso, a questão de fundo que pautará toda a nossa análise pode ser formulada da seguinte maneira: se testar uma nova substância química em um olho de uma pessoa amarrada é considerado imoral, o que justifica usar um coelho para isso? Se infectar alguém à força para descobrir a cura da malária é proibido segundo os princípios da Bioética (médica), por que é permitido fazer isso com um primata?
O foco deste ensaio ficará restrito ao segundo desses dois tópicos. Em outras palavras, ele passará ao largo da tese de que a pesquisa em animais produz conhecimento valioso, cuja aplicação ao caso humano pode ser generalizada, ou, ao contrário, se o modelo animal é uma representação cientificamente inadequada do que poderia ocorrer conosco. Portanto, a análise não se debruçará sobre os dados estatísticos que, supostamente, dão apoio à pesquisa (segundo os pesquisadores) ou a derrubam como modelo útil na investigação biomédica (segundo os animalistas). Trataremos, em vez disso, apenas dos marcadores de natureza ética dessa discussão.1 Como na maioria dos debates sobre as diversas áreas a respeito das quais a Ética Animal teria algo a dizer, encontraremos uma coleção de posições aparentemente irreconciliáveis, cujos adeptos quase sempre as tomam como verdades autoevidentes e irrefutáveis. Ocorre que muitos dos pontos que perpassam essa discussão estão implícitos, sejam eles de concordância ou de discordância. Este ensaio não pretende incendiar esse debate com novos argumentos, mas, antes, trazer alguma clareza a ele, iluminando os pontos cegos do tema e identificando as premissas subjacentes às divergências de opinião. O objetivo aqui é fornecer um mapa filosófico dessa discussão em benefício daqueles que se acham envolvidos nela, de uma forma ou de outra. Dito isso, a questão de fundo que pautará toda a nossa análise pode ser formulada da seguinte maneira: se testar uma nova substância química em um olho de uma pessoa amarrada é considerado imoral, o que justifica usar um coelho para isso? Se infectar alguém à força para descobrir a cura da malária é proibido segundo os princípios da Bioética (médica), por que é permitido fazer isso com um primata?