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Um Ponto de Virada Climática: Como a Eliminação da Agropecuária Animal Pode Reduzir Drasticamente o Aquecimento Global

earth becoming cooler due to shift toward vegan diet

Em uma era de crescente preocupação com as mudanças climáticas, um  estudo marcante conduzido por pesquisadores da Universidade de Stanford e da Universidade da Califórnia, Berkeley, lançou luz sobre uma solução frequentemente negligenciada: a eliminação global da agropecuária animal. As descobertas abrangentes revelam que a transição para dietas baseadas em plantas em escala global poderia estabilizar os níveis de gases de efeito estufa (GEE) por 30 anos e reduzir 68% das emissões cumulativas de CO₂ até 2100. Essa mudança ambiciosa apresenta uma oportunidade transformadora para combater as mudanças climáticas e mitigar seus impactos devastadores.

Compreendendo o Custo Climático da Agropecuária Animal

A agropecuária animal é uma das principais contribuidoras para as emissões de gases de efeito estufa, gerando níveis significativos de metano (CH₄) e óxido nitroso (N₂O) — dois gases muito mais potentes do que o dióxido de carbono (CO₂) em seu potencial de aquecimento global. O estudo destaca a dupla ameaça representada por este setor: emissões contínuas e a perda de biomassa que sequestra carbono devido ao uso da terra para criação de animais e produção de ração.

A produção pecuária ocupa quase 30% da superfície terrestre do planeta, deslocando ecossistemas naturais que poderiam, de outra forma, armazenar vastas quantidades de carbono. Os pesquisadores estimam que acabar com a agropecuária animal liberaria essa terra para recuperação de biomassa, sequestrando até 790 gigatoneladas (Gt) de CO₂ em três décadas. Essa recuperação poderia compensar as emissões históricas de carbono resultantes de mudanças no uso da terra e reduzir drasticamente o acúmulo atmosférico de CO₂.

Modelando o Impacto: O Que uma Eliminação Global Poderia Alcançar?

Usando dados públicos sobre emissões e modelos de recuperação de biomassa, os pesquisadores examinaram os efeitos de diferentes cenários de transição alimentar. Estes incluíram uma adoção global imediata de dietas baseadas em plantas e uma eliminação mais gradual da agropecuária animal em 15 anos. Ambos os cenários demonstraram benefícios climáticos sem precedentes.

  1. Redução de Emissões de GEE: A eliminação completa da agropecuária animal criaria uma redução equivalente a 25 Gt de CO₂ por ano. Esse valor considera tanto a cessação das emissões de metano e óxido nitroso quanto o potencial de absorção de carbono dos ecossistemas em recuperação.
  2. Uma Pausa de 30 Anos no Aquecimento: O metano, que tem uma vida útil relativamente curta na atmosfera (nove anos), veria seus níveis caírem rapidamente após a redução das emissões da pecuária. Da mesma forma, a redução a longo prazo do óxido nitroso traria benefícios sustentados. Combinados com a recuperação da biomassa, essas mudanças poderiam efetivamente interromper o potencial de aquecimento da atmosfera por três décadas, ganhando tempo crucial para outros esforços de mitigação climática.
  3. Alinhamento com o Acordo de Paris: O estudo projeta que essas mudanças, por si só, poderiam alcançar mais de 50% das reduções de emissões necessárias para limitar o aquecimento global a 2°C acima dos níveis pré-industriais. Isso torna a transição alimentar uma solução viável e complementar à transição para energias renováveis.

Liberando o Potencial: Por Que Focar na Agropecuária?

Embora reduzir o uso de combustíveis fósseis permaneça essencial, a eliminação da pecuária oferece uma vantagem única: ela aborda simultaneamente as emissões atuais e históricas. O metano e o óxido nitroso decaem relativamente rápido em comparação ao CO₂, o que significa que os benefícios das reduções das emissões da pecuária seriam percebidos dentro de décadas. Além disso, a natureza intensiva em terras da agropecuária a torna o maior motor de desmatamento e destruição de habitats.

O estudo também descobriu que soluções parciais, como a substituição apenas de ruminantes (como gado e ovelhas), poderiam alcançar 90% dos benefícios climáticos de uma eliminação total. Os ruminantes são responsáveis por uma parcela desproporcional das emissões agrícolas devido à fermentação entérica e à natureza intensiva de recursos de sua produção de ração.

Superando Desafios: Considerações Econômicas e Sociais

A transição para longe da agropecuária animal não é uma tarefa pequena. A criação de animais sustenta o sustento de mais de um bilhão de pessoas em todo o mundo e desempenha um papel significativo nos sistemas alimentares globais. O estudo reconhece esses desafios, mas enfatiza que o custo da inação — desastres climáticos crescentes, perda de biodiversidade e insegurança alimentar — supera de longe os investimentos necessários para uma transição gerenciada.

Os pesquisadores propõem que governos e organizações internacionais priorizem o apoio às comunidades afetadas. Isso inclui:

  • Programas de Requalificação: Fornecendo novas oportunidades econômicas para aqueles que dependem da pecuária.
  • Desenvolvimento de Infraestrutura: Investindo em agricultura e sistemas alimentares baseados em plantas para garantir acessibilidade a dietas diversificadas e nutritivas.
  • Cooperação Global: Coordenando esforços para garantir uma distribuição justa de recursos e evitar exacerbar desigualdades durante a transição.

Mudando Atitudes: Um Caminho Realista Adiante

Os céticos podem questionar a viabilidade de convencer bilhões a mudarem para dietas baseadas em plantas em 15 anos. No entanto, tendências históricas na adoção de alimentos e tecnologias sugerem o contrário. Desde a rápida proliferação de smartphones até a popularidade global de alimentos como pizza e sushi, as mudanças sociais frequentemente ocorrem mais rapidamente do que o esperado quando novas opções são atraentes, acessíveis e convenientes.

Patrick Brown, um dos coautores do estudo e CEO da Impossible Foods, observa que produtos inovadores à base de plantas podem acelerar essa mudança. Ao oferecer alternativas que igualem ou superem o sabor e a conveniência dos produtos tradicionais de origem animal, os consumidores podem fazer a transição sem sacrificar preferências alimentares.

Um Chamado à Ação: Aproveitando a Ciência para um Futuro Viável

As descobertas deste estudo, publicadas no periódico PLOS Climate, destacam a urgência de repensar os sistemas alimentares globais. Embora a eliminação da agropecuária animal sozinha não possa resolver a crise climática, ela representa uma intervenção poderosa e imediata com benefícios de longo alcance. Ao complementar a adoção de energias renováveis com mudanças alimentares, a humanidade tem um caminho tangível para evitar um aquecimento catastrófico e garantir um futuro sustentável.

Como concluem os autores, abordar a agropecuária animal não é apenas um imperativo moral, mas uma necessidade prática. O caminho a seguir exige liderança ousada, inovação científica e ação coletiva para transformar uma das práticas mais antigas da humanidade em um pilar de um mundo resiliente e consciente do clima.

Fonte:  Rapid global phaseout of animal agriculture has the potential to stabilize greenhouse gas levels for 30 years.pdf

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