Uma Conversa com Rubem Gomes: Desafios e Conquistas do Movimento Vegano em Angola
Rubem Gomes é uma figura central no movimento vegano em Angola. Como coordenador da AVA - Associação Vegetariana Angolana, ele tem trabalhado incansavelmente para promover o veganismo e sensibilizar a população sobre os benefícios de uma alimentação baseada em plantas. Nesta entrevista, Rubem compartilha suas perspectivas sobre os desafios enfrentados pelo movimento vegano em Angola, suas motivações pessoais e as iniciativas que a AVA tem implementado para fomentar um estilo de vida mais saudável e ético. Entre as conquistas destacam-se a consistência dos eventos da AVA, o surgimento de um mercado Plant-Based no país, e a autorização para implementar lanches veganos nas escolas públicas.
Guia Vegano: Rubem, como você descreveria o estado atual do movimento vegano em Angola? Quais foram as principais conquistas da AVA nos últimos anos?
Rubem: O estado atual do movimento vegano em Angola é de crescimento, embora não tenhamos dados estatísticos de quantos vegetarianos ou veganos temos no país, mas o que temos notado é que o nível de interesse tem aumentado substancialmente, principalmente entre a faixa dos 20 aos 50 anos, com maior incidência para as mulheres. Relativamente às conquistas, temos conseguido manter a consistência nos nossos eventos, que têm tido muito impacto na vida de muita gente e também a fazer emergir um mercado Plant-Based em Angola, algo que até então não existia no nosso país. Já conseguimos levar a preocupação dos direitos dos animais à Assembleia da República, aguardando apenas o diferimento do nosso memorando relativamente à alteração da lei do ambiente. Temos uma comunidade de cerca de mais ou menos 240 pessoas, todas elas com um grande interesse de mudança para uma dieta à base de plantas. O número de voluntários aumentou significativamente; hoje podemos dizer que somos mais de 30 voluntários. Conseguimos uma autorização para implementar, a nível das escolas públicas, os lanches veganos escolares, algo que é realmente significativo porque, majoritariamente, iremos trabalhar com crianças.
Guia Vegano: O que motivou você a se tornar vegano e como essa decisão impactou sua vida pessoal e profissional?
Rubem: Sou vegano ativista pelos animais. As minhas motivações, além de serem éticas, são filosóficas do ponto de vista de que todos nós temos o direito à vida e que ninguém tem o direito de negar isso a outrem.
Guia Vegano: Quais são os maiores desafios que o movimento vegano enfrenta em Angola, especialmente em termos de aceitação cultural e acesso a produtos veganos?
Rubem: Começando pela última pergunta, a nível de produtos tem aumentado, falo de produtos veganos industrializados. Hoje já encontramos uma grande variedade de leite vegetal nas prateleiras dos supermercados, mas ainda não é o desejado, porque o país é grande e em outros pontos não se encontram esses produtos, apenas na capital do país. O nosso maior desafio é o comprometimento com a causa. Algumas pessoas ainda não têm noção do quão importante é essa luta e muitas vezes negligenciam o veganismo por não entenderem a luta e não saberem se posicionar diante da mesma. O que temos estado a fazer é informar todas as pessoas, embora exista muito pouca resistência por parte dos jovens.
Guia Vegano: A AVA organizou a terceira edição da Feira Vegana de Luanda. Como você avalia a receptividade do público a este evento e qual a importância de iniciativas como essa para a promoção do veganismo?
Rubem: A receptividade tem sido muito boa, embora seja um evento de caráter específico, mas existe muito interesse entre as pessoas. A nossa média de frequência varia entre 200 a 500 pessoas nos dois dias de feira, mas o número tem aumentado à medida que a feira vai se tornando regular e popular entre as pessoas. A feira vegana no momento é o nosso maior evento, é um evento ativista e é na feira onde conseguimos reunir o maior número de pessoas.
Guia Vegano: A campanha "O Poder das Plantas" foi levada ao Centro Oncológico de Luanda para mostrar os benefícios de uma dieta baseada em plantas na prevenção do câncer. Quais foram os principais resultados dessa campanha e como a AVA pretende expandir essas iniciativas educacionais?
Rubem: Sim, conseguimos levar essa campanha ao centro oncológico no sentido de mostrar aos médicos e aos pacientes que é possível fazer a prevenção de doenças crônicas através de uma dieta à base de plantas. As pessoas ficaram perplexas com a iniciativa e mostraram-se receptivas ao assunto, mas do ponto de vista de aplicabilidade, isso passa muito pelas políticas públicas do nosso próprio governo, algo que pode andar a passos lentos por causa de alguns interesses inconfessos. Mas a mensagem ficou e voltaremos com certeza a realizar o mesmo evento sob as mesmas circunstâncias, com vista a educar mais pessoas.
Guia Vegano: A distribuição de refeições veganas gratuitas tem sido uma parte importante do trabalho da AVA. Como você vê o impacto desse programa nas comunidades atendidas e quais são os planos futuros para essa iniciativa?
Rubem: Este projeto realmente é muito significativo para nós, mesmo até para as comunidades, porque existe muita carência a nível alimentar e além disso, há muitas crianças em estado de desnutrição. O impacto é sempre positivo, todas as pessoas recebem a comida de bom grado. Infelizmente, o projeto está parado por questões alheias à nossa vontade. Nós iremos dar seguimento assim que tivermos a nossa própria sede, porque o nosso objetivo é criar uma cozinha comunitária para dar continuidade ao projeto e atender às necessidades das comunidades mais carentes.
Guia Vegano: Durante a live que você realizou recentemente, foram discutidos os desafios do movimento vegano em Angola. Quais são as principais barreiras que precisam ser superadas para que mais pessoas adotem o veganismo no país?
Rubem: A principal barreira é mesmo a informação, que ainda não chega a todos. Nós sabemos das nossas limitações a nível de alcance, temos limitações em muitos aspectos. Só para ter noção, existe um grande número de pessoas em outros pontos do país pedindo a nossa intervenção, mas ainda não temos condições para chegar até essas pessoas. Outra parte da barreira é por parte do meio social abastado, que ainda olha para a carne como um produto de alto valor nutricional e como um símbolo de luxo e bem-estar. Fora isso, existe uma outra classe de pessoas que recebe bem a mudança do sistema alimentar, até porque uma parte da base da nossa cultura tem a ver com agricultura.
Guia Vegano: A campanha vegana para lanches escolares visa massificar o estilo de vida vegano entre as crianças. Como tem sido a resposta das escolas e dos pais a essa iniciativa, e quais são os próximos passos para ampliá-la?
Rubem: Nós neste momento estamos numa fase de ampliação da campanha, estes são os nossos próximos passos, e já dei uma pequena pincelada sobre a mesma numa das respostas acima. Além de termos luz verde para a implementação do programa na sua totalidade, doravante pensamos também em introduzir os pais nessa campanha com os meninos. Pensamos que é importante que eles estejam presentes e sintam a preocupação e a necessidade que os meninos têm de mudar. Não levamos apenas os lanches, mas também a informação dos cuidados que devemos ter com os animais é superimportante. Isso é uma grande alegria, trabalhar com as crianças, porque elas sempre nos dão a visão de que é possível todos nós mudarmos. Elas ficam todas entusiasmadas porque ajudam também na confecção dos alimentos.
Guia Vegano: O movimento vegano em Angola enfrenta alguma resistência por parte de instituições religiosas ou culturais? Como a AVA trabalha para contornar esses obstáculos e promover uma visão mais inclusiva do veganismo?
Rubem: Relativamente a isso, não enfrentamos ainda resistência até o momento, até porque já fizemos atividades em instituições religiosas.
Guia Vegano: Olhando para o futuro, quais são suas esperanças e metas para o movimento vegano em Angola nos próximos cinco anos? Quais novas estratégias a AVA planeja implementar para atingir esses objetivos?
Rubem: O nosso próximo passo é o festival que albergará o primeiro congresso de nutrição vegetariana no país. Ainda não temos parceiros sólidos para embarcarem nessa empreitada conosco, mas estamos otimistas para os próximos anos. Acreditamos que vamos conseguir a curto ou médio prazo organizar o festival. Nós vamos continuar a massificar o veganismo em Angola com eventos, campanhas e ativismo de rua. Vamos ampliar as nossas ações e sermos mais agressivos. Os próximos anos serão muito melhores para a nossa organização. Todos temos nos empenhado e acreditamos que uma grande parte do nosso país será veganizada a curto ou médio prazo.
Perspectivas Futuras
A entrevista com Rubem Gomes revela o compromisso e a paixão que impulsionam o movimento vegano em Angola. Através de suas palavras, fica claro que, apesar dos desafios, há um crescente reconhecimento dos benefícios do veganismo tanto para a saúde humana quanto para o meio ambiente. A AVA, sob a liderança de Rubem, continua a ser uma força motriz na promoção de uma vida mais ética e sustentável, com muitas iniciativas promissoras no horizonte. Os próximos anos prometem ser de expansão e consolidação para o movimento vegano no país, com a organização de festivais, congressos e uma maior atuação nas escolas e comunidades.
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