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Desvendando a Crise das Cinzas: Uma Conversa com a Dra. Paula Brügger sobre Clima, Especismo e o Futuro do Planeta

paula brugger entrevistaPaula Brügger, bióloga, doutora em Sociedade e Meio Ambiente e figura de destaque no Observatório da Justiça Ecológica e na Universidade Federal de Santa Catarina, é uma voz poderosa no debate sobre as conexões entre a crise climática, a perda de biodiversidade e o especismo. Com base em décadas de pesquisa e reflexão, ela nos convida a repensar nosso papel na destruição ambiental e a agir com urgência. Nesta entrevista, exploramos suas perspectivas sobre os desafios que enfrentamos como sociedade e as oportunidades de mudança que ainda temos para garantir um futuro sustentável.


Guia Vegano: Dra. Paula, o Brasil é um país conhecido por sua biodiversidade, mas enfrenta taxas alarmantes de desmatamento e incêndios florestais. Como chegamos a essa situação e qual seria o caminho mais eficaz para reverter esse cenário?

Dra. Paula: O Brasil é o país mais biodiverso do planeta, segundo diversos estudos. Entretanto, o nosso modelo de agricultura predominante – o da produção massiva de grãos destinados à pecuária, e a própria pecuária – é incompatível com a manutenção dessa riqueza. Essa infeliz escolha se opõe historicamente aos modelos biodiversos de agricultura dos povos autóctones – os Garden models, mantenedores da biodiversidade – além de ser incompatível com a dinâmica ecológica dos trópicos. Motivo de orgulho para muitos, esse sistema é responsável por praticamente todos os males que destroem a saúde ambiental, aqui e no mundo. São eles: desmatamentos; incêndios; desfaunação; perda de biodiversidade; desertificação; poluição e depleção de aqüíferos e cursos d'água; uso indiscriminado de agrotóxicos e antibióticos; etc., e, é claro, mudanças climáticas. Como se isso não bastasse, esse sistema é extremamente cruel com os animais: milhares deles são explorados, torturados e mortos todos os dias. Esse setor produtivo, associado a grandes latifúndios, está ainda bastante associado à grilagem de terras, ao trabalho análogo à escravidão, bem como à violência contra povos originários, além de produzir fome, uma vez que as áreas destinadas a tais commodities poderiam ser usadas para plantar "arroz e feijão". E, por último, mas não menos importante, é um sistema que alimenta clusters de grande influência política, econômica e midiática, cujo poder avassalador se corporifica em medidas que visam flexibilizar a legislação que protege os direitos da natureza, dos animais e de seres humanos. Em resumo, precisamos urgentemente migrar para um sistema alimentar baseado em plantas e oriundo de pequenas propriedades, pois o que comemos esculpe a biosfera e os sistemas sociais, políticos, econômicos e culturais.

Guia Vegano: O conceito de especismo, que você discute com frequência, pode parecer abstrato para algumas pessoas. Como você explicaria, de maneira simples, por que ele é tão central para entendermos a crise ambiental atual?

Dra. Paula: O termo especismo foi proposto pelo filósofo britânico Richard Ryder, na década de 1970, para se referir a formas de discriminação praticadas por nós humanos contra outras espécies animais. Esse termo é utilizado numa analogia ao racismo e ao sexismo, que são (também) preconceitos baseados em diferenças moralmente irrelevantes. Ryder afirma que todas as espécies animais são capazes de sentir dor e angústia e que devemos estender a nossa preocupação com a dor e a angústia a qualquer criatura com essas capacidades, seja ela humana ou não. O conceito de especismo encontra-se em consonância com o teor da famosa Declaração de Cambridge sobre a Consciência em Animais Humanos e Não-Humanos, pois, como Ryder diz, o que realmente importa na moralidade é a consciência do sofrimento que cada ser experimenta. Vale destacar que o especismo pode ser "seletivo"... É muito comum que as pessoas reconheçam o sofrimento e diversas capacidades afetivas e cognitivas em algumas espécies – notadamente cães e gatos – mas não em muitas outras. Isso resulta em formas de agir diferentes quanto a espécies com basicamente os mesmos atributos. Exemplo clássico é a forma como tratamos cães, de um lado, e porcos, de outro. Tal agir vem de julgamentos que se baseiam em percepções culturais, gostos e interesses pessoais, e não em evidências científicas sobre senciência, afetividade ou inteligência, por exemplo. Com isso, seres sencientes/conscientes como bovinos, suínos e aves são submetidos a práticas legais, mas moralmente repugnantes. Por conta do nosso especismo seletivo, banalizamos tratamentos que são verdadeiramente abomináveis. E enquanto esses animais perecem nesse processo que é nutrido por quem compra seus produtos, o meio ambiente é destruído. Em suma, se não fôssemos especistas, como sociedade, essa indústria não seria tão poderosa, econômica e politicamente, e não produziria tanta destruição e injustiça.

Guia Vegano: Muitas vezes, associamos mudanças climáticas apenas às emissões de carbono, mas você aborda questões mais amplas, como os ciclos biogeoquímicos e o impacto do uso da terra. O que o público geral precisa entender sobre essas conexões?

Dra. Paula: Para produzir tantos produtos de origem animal, são necessárias grandes mudanças no uso da terra. No Brasil, tais mudanças têm sido fortemente relacionadas à expansão das pastagens e plantações de soja, que estão associadas a taxas alarmantes de desmatamento e incêndios florestais. Tudo isso causa perda de habitats e de biodiversidade, e ainda impacta fortemente o balanço hídrico local e regional. Esse processo também causa a degradação dos solos, entre muitos outros efeitos nocivos que resultam da conversão de ecossistemas naturais em pastagens ou culturas destinadas à alimentação do gado. As florestas, por exemplo, representam 25% da biomassa mundial e 70% da biodiversidade terrestre, sendo a maior parte dela encontrada abaixo do solo. Ali vivem bactérias, fungos e outros organismos responsáveis por funções ecossistêmicas vitais. E a maior parte do armazenamento e seqüestro de carbono de uma floresta – essenciais para a mitigação das alterações climáticas – acontece no subsolo. Os ecossistemas acima e abaixo do solo estão inextricavelmente ligados e, com isso, a conversão de florestas em agricultura ou pastagens tem muitos impactos negativos. Além disso, desmatamentos, exploração madeireira, fragmentação de habitats e incêndios florestais provocam desfaunação, ou seja, a perda de animais silvestres que dispersam sementes: metade de todas as espécies de plantas depende de aves e mamíferos para transportar suas sementes para novos habitats. Muitas árvores tropicais de grande porte – com contribuições cruciais para a estocagem de carbono – dependem de grandes vertebrados para dispersão de suas sementes. Apesar disso, muitos modelos de seqüestro de carbono não levam em conta o papel que a biodiversidade desempenha no armazenamento de carbono. Essas mudanças quali-quantitativas mostram a interligação entre a vida e os componentes físicos da Terra que estão inter-relacionados formando um sistema complexo capaz de manter certo grau de equilíbrio global, incluindo a estabilidade climática. É por isso que venho defendendo que é bem mais provável que os principais fatores que afetam o clima global não estejam relacionados principalmente às emissões diretas de gases do efeito estufa (perspectiva hegemônica), mas aos mencionados aqui, responsáveis pela aniquilação de mecanismos homeostáticos e de resiliência em escala global: destruição de ecossistemas naturais; alterações quali-quantitativas na biomassa; desfaunação e perda de biodiversidade, as quais afetam os ciclos biogeoquímicos, hídricos, etc. O resultado é a tendência de haver condições climáticas cada vez mais extremas. Tenho dito que estamos fazendo emergir uma mãe-natureza bipolar, fruto da nossa completa insanidade como espécie. De qualquer forma, mesmo considerando as emissões diretas como o contribuinte mais poderoso, a pecuária é uma enorme ameaça à estabilidade climática, já que as emissões de gases de efeito estufa provenientes de alimentos de origem animal são o dobro dos de origem vegetal. Concluindo, hoje, lamentavelmente, temos dois tipos de negacionismo climático: os que negam as mudanças, tout court, e os que negam o papel nocivo da dieta especista. Todavia, a pecuária é, sim, a principal força destrutiva no planeta, e a principal causadora das mudanças climáticas.

Guia Vegano: O Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo. Você acredita que é possível equilibrar a relevância econômica desse setor com a necessidade de proteger nossos biomas? Ou isso exige uma transformação radical?

Dra. Paula: Em primeiro lugar, esse setor produtivo não deveria ser considerado de relevância alguma, seja social, econômica ou para a saúde humana. Somam-se a isso as graves questões morais e éticas envolvidas na pecuária, no que diz respeito aos animais. Ademais, nos moldes de uma sociedade capitalista, não é possível "equilibrar" esses dois interesses em profundo conflito: proteção ambiental e superprodução dessa commodity. A resposta a essa pergunta poderia ser longa e cheia de dados. Mas além de tudo o que foi argumentado aqui, vale dizer que se ao preço dos produtos oriundos desse setor fossem somados todos os subsídios e renúncias fiscais que ele recebe, e quantificados e monetarizados os seus impactos de todos os tipos, qual seria a real relevância desse setor para a economia? E, sobretudo: como ficariam os preços desses produtos? Pessoalmente não acredito ser possível conciliar proteção ambiental com a sanha capitalista de crescimento contínuo, a qualquer custo. Enquanto houver demanda por carne e itens de origem animal, haverá oferta e destruição, e mesmo havendo uma legislação robusta no país no que tange ao meio ambiente, não há como rastrear ou fiscalizar esse gigantesco setor. A história recente tem demonstrado o fracasso dessas tentativas. A sangria dos nossos biomas continua e se acentua a cada ano. Alguns deles estão próximos aos pontos de não retorno. Precisamos, portanto, de uma transformação radical – no sentido de ir à raiz do problema: a pecuária – a fim de resolver esse e muitos outros problemas como a fome, citada antes.

Guia Vegano: Você mencionou que até mesmo nossas línguas reproduzem o especismo. Pode dar exemplos de como essa forma de preconceito cultural se manifesta no nosso cotidiano e por que é importante questioná-la?

Dra. Paula: Vamos lá: cachorro, burro, cavalo, galinha... Será que esses "adjetivos", usados como xingamentos, correspondem ao comportamento real desses animais? Quando chamamos alguém de "burro", por exemplo, estamos implicitamente desconsiderando a inteligência e a sensibilidade que os burros realmente possuem. Da mesma forma, ao dizer que uma pessoa é "uma galinha", estamos associando isso a ideias de covardia ou promiscuidade, desconsiderando as características complexas das galinhas, como sua capacidade de formar vínculos sociais e cuidar de seus filhotes. Esses exemplos, aparentemente inofensivos, reforçam o especismo ao perpetuar estereótipos que desvalorizam os animais e justificam sua exploração. É fundamental refletirmos sobre como as palavras que usamos moldam nossa visão de mundo e como elas podem ser ferramentas de opressão. Questionar esses padrões linguísticos é uma forma importante de iniciar mudanças culturais profundas que nos afastem do especismo.

Guia Vegano: Na sua opinião, por que, mesmo diante de evidências científicas tão claras sobre o impacto negativo da agropecuária, o consumo de produtos de origem animal ainda é tão defendido em escala global?

Dra. Paula: Para começar, os governos de muitos países – e o Brasil é um exemplo emblemático – fazem vista grossa quanto aos impactos negativos desse setor e até estimulam a produção e o consumo desses produtos. Também muitos médicos e até nutricionistas acreditam, por ignorância no assunto, que tais produtos são necessários para garantir uma boa saúde. Soma-se a isso a falta de informação do público em geral sobre a viabilidade e os benefícios das dietas veganas, ou seja, à base de plantas, além dos malefícios das dietas tradicionais, especistas, e dos seus impactos sobre o meio ambiente e os animais explorados nesse processo produtivo. Há ainda questões culturais ligadas a tradições afetivas, crenças, etc., que servem como pretextos para que as pessoas sequer tentem uma mudança. Vale também mencionar que, se os produtos de origem animal tivessem preços que refletissem seus danos e não fossem subsidiados, os alimentos de origem vegetal seriam muito mais competitivos. Esse é um breve resumo dos empecilhos envolvidos na mudança global da nossa dieta cruel e destrutiva.

Guia Vegano: O que mais te preocupa no ritmo atual de destruição ambiental e o que você acredita que as pessoas comuns podem fazer, agora mesmo, para contribuir para a mudança?

Dra. Paula: O que mais me inquieta no momento é algo cuja resposta ninguém pode dar: quais são os pontos de não retorno no que diz respeito a diversos ecossistemas tanto brasileiros quanto mundiais? Os processos sociais e naturais são complexos, dialéticos... Uma gota faz transbordar o copo. Que fique claro que essa preocupação não é de natureza antropocêntrica: ainda que Gaia, sim, continue sem nós, "quintilhões" de seres vivos sencientes poderão sucumbir em processos de desfazimento da teia da vida tal qual a conhecemos hoje. As mudanças climáticas já estão batendo às nossas portas, mas não sem aviso prévio. A resposta curta e objetiva para promovermos uma revolução está na famosa frase "Go Vegan!" Trata-se de uma solução simples, que depende apenas da atitude de cada um de nós, e que é saudável e acessível. Precisamos parar com a cultura anacrônica de uso intensivo de recursos naturais e migrarmos para uma cultura de uso intensivo do conhecimento. As dietas veganas são um primeiro e importantíssimo passo nesse sentido.

Guia Vegano: O conceito de rewilding tem ganhado força em debates ambientais. Qual o papel do rewilding no Brasil e como ele pode ajudar na recuperação de ecossistemas como o Pantanal e a Amazônia?

Dra. Paula: O conceito de rewilding, ou seja, de "reasselvajamento", remete à ideia de tornar um ecossistema novamente natural/selvagem e com isso restaurá-lo de forma holística. Esse conceito tem muito a ver com a ideia de saúde, preservação e capacidade de um ecossistema cumprir suas funções ecológicas. A Amazônia, por exemplo, já foi chamada de "pulmão do mundo" por essas razões, mas o desmatamento para a pecuária e a produção de soja, que ocorrem de forma crescente e desenfreada, estão ameaçando esse dito status. Entretanto, devo dizer que essa metáfora é bastante inadequada, uma vez que pulmões consomem, e não produzem oxigênio. Mas o pior aspecto desse termo talvez seja limitar à produção de "ar puro" as múltiplas e importantíssimas funções ecológicas das florestas. Três delas, vitais, são: manutenção da integridade dos solos; da biodiversidade; e dos processos de evapotranspiração, garantindo um bom balanço hídrico. Além disso, elas atuam como uma espécie de sistema-tampão, em termos de calor, e são importantes fontes e sumidouros no que diz respeito ao balanço químico da biosfera (por meio dos ciclos biogeoquímicos) e da atmosfera, influenciando a sua composição química global. A floresta Amazônica é um ecossistema-chave no que toca às mudanças climáticas. No ano de 2000, o engenheiro e físico Bautista Vidal já concordava com a ideia de que mudanças climáticas globais têm origem na Amazônia: "19% da água doce do planeta está na Amazônia e a ameaça sobre a floresta, que é uma imensa bomba de calor, pode afetar os climas de diversos pontos do planeta." Precisamos, pois, urgentemente, migrar para um sistema alimentar baseado em plantas e garantir que a floresta se mantenha em pé. Precisamos de uma visão holística, de "saúde única": animal, humana e ambiental, como foi na abordagem que fiz no meu livro Amigo Animal, de 2004. Finalizo essa pergunta dizendo que, se o termo "pulmão do mundo" for entendido sob uma perspectiva holística, sistêmica, ele ganha atualidade e respalda o vaticínio de Vidal. O termo referenda, ainda, a necessidade de reasselvajarmos os biomas que sangram sob a agropecuária, pois só assim eles poderão respirar e garantir a respiração de todos.

Guia Vegano: A Educação é frequentemente citada como chave para mudanças profundas, mas você aponta falhas no modelo atual, que perpetua o especismo. Como seria um sistema educacional verdadeiramente transformador para o meio ambiente e os direitos dos animais?

Dra. Paula: Essa pergunta está no cerne de tudo o que venho trabalhando há décadas, começando pelo meu livro Educação ou adestramento ambiental? cuja primeira edição é de 1994. Vou tentar resumir os pontos mais importantes. Primeiro, a educação, seja ela formal ou não, não se constitui num agregado de conhecimentos e valores que pairem acima da cultura e dos valores de uma sociedade. É por isso que a educação hegemônica é "anti-ambiental", especista, colonialista, racista, etc. De fato, o próprio adjetivo "ambiental", posto na educação, sinaliza que a educação tradicional é "não-ambiental". No que tange ao especismo, em particular, a educação formal é aberta e orgulhosamente especista em praticamente todas as áreas do conhecimento e níveis de ensino. Mesmo a educação dita ambiental não dá conta de combater o especismo, embora a nossa relação com os animais possa ser vista como uma relação sociedade-natureza. Isso acontece porque essa "modalidade" de educação é herdeira da ética conservacionista tradicional, a qual tem pouca ou nenhuma afinidade com a questão dos direitos animais. Para piorar, os meios de comunicação, sejam eles jornais, televisão, propaganda, e até mesmo o cinema são essencialmente especistas em suas comunicações e conteúdos. Precisamos, portanto, de uma profunda revolução para que a educação seja ambiental e antiespecista além de, é claro, ser crítica quanto a outras formas de dominação e tirania. Mas é imprescindível sublinhar: isso é o que a educação como um todo precisa ser! "Ilhas" de outras racionalidades, como cursos de extensão, especialização, etc., são importantes, mas têm pouco poder transformador. Uma revolução na educação requer uma mudança de paradigma e não mudanças pontuais, superficiais, ou apenas de comportamentos. Lamentavelmente, a visão hegemônica de educação ambiental permanece limitada às suas dimensões naturais e técnicas, e afeita a temas como o lixo, a reciclagem de materiais, ou a programas de reflorestamento, por exemplo. Tais ações são importantes, mas teriam que ser exploradas na "espessura" do tempo e do espaço, envolvendo as questões sociais, éticas, políticas, econômicas, etc., que fizeram emergir tais contextos. Contudo, na maioria dos casos, o que temos é uma abordagem rasa e a-histórica que permanece circunscrita à conservação de recursos naturais, e com isso não ultrapassa o paradigma dominante, cujo fundamento é a razão instrumental. A isso chamei de "adestramento", e não de "educação ambiental". Em outras palavras, não basta pintar de verde uma área de cimento no fundo de um pátio e anunciar aquele espaço como "área verde". Essas e outras críticas estão no meu curtíssimo texto Visões estreitas na Educação Ambiental, publicado pela Ciência Hoje em 1998, e disponível na plataforma ResearchGate. Quanto a uma educação que contemple os direitos animais, estamos ainda mais distantes. Venho propondo uma Educação Duplo A – Ambiental e Abolicionista Animal – já que um ambientalismo genuíno e os direitos animais encontram seus óbices precisamente no mesmo paradigma mecanicista e instrumental. Mas resta um longo caminho a ser trilhado. E o mundo de hoje, assolado pela ascensão da extrema direita e suas fake news, nos projeta um cenário muito assustador. Contudo, a alternativa é lutar ou lutar.

Guia Vegano: Por fim, quando olhamos para o futuro do Brasil e do planeta, o que te dá esperança? Existe algo no comportamento humano ou na ciência que sugere que ainda podemos evitar os piores cenários?

Dra. Paula: Costumo dizer que sou pessimista na teoria e otimista na prática. Não poderia deixar de ser pessimista diante das evidências perturbadoras sobre a crise ambiental e moral que vivenciamos hoje. Mas se não tivesse alguma esperança, nem estaria envolvida nesta entrevista... Contudo, acredito que temos muito pouco tempo para reverter ou pelo menos diminuir o ritmo das atividades produtivas predatórias que causam os danos aqui citados, entre outros. A ciência pode e tem contribuído com dados muito relevantes para uma tomada de ação. Mas a ciência se separou historicamente da ética e, portanto, é incapaz de dar as respostas que dizem respeito aos nossos valores, atitudes e comportamentos morais. Muitas são as atividades destrutivas sobre as quais temos pouca ou nenhuma influência. Sei que é repetitivo, mas não há como não frisar que a cada refeição podemos fazer a diferença. Um estudo que citei em mais de um trabalho mostra que a adoção de uma dieta vegana global poderia estabilizar os níveis de gases de efeito estufa por três décadas e compensar quase 70% das emissões de CO2 neste século. A adoção dessa medida também liberaria vastas áreas para o cultivo de alimentos de origem vegetal, diminuindo seus preços. E tornaria possível o restabelecimento de vários ecossistemas naturais, e o retorno progressivo da vida selvagem. No Brasil, mais de 200 milhões de hectares são pastagens ou plantações de commodities destinadas sobretudo à pecuária. Isso é muita coisa! É visão holística; é saúde única: animal, humana e ambiental. Mãos à obra!

borboletaReflexões Finais: Agir Pelo Futuro do Planeta

A conversa com a Dra. Paula Brügger é um convite para refletirmos sobre nossas escolhas e assumirmos a responsabilidade por um mundo em colapso. Suas palavras nos lembram que, embora a situação seja crítica, ainda há espaço para mudanças — desde que haja união, compaixão e ação imediata. O momento de agir é agora.


Fontes:

Stohr, W. (2013). Belowground ecosystems: the foundation for forest health, restoration and sustainable managementJournal of Environmental Assessment Policy and Management (JEAPM)15(04), 1-17. World Scientific Publishing Co. Pte. Ltd.

Stokstad, E. (2022, January). Loss of seed-hauling animals spells trouble for plants in warming world. Science News, Climate. https://www.science.org/content/article/loss-seed-hauling-animals-spells-trouble-plants-warming-world


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