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O
Conceito de Natureza
como forma de compreender a realidade
Autor: Dennis Zagha Bluwol,
Geógrafo
dennis@guiavegano.com
Poucas vezes se vê em nossa sociedade o pensamento
de que muito do que não caminha do melhor modo possível
para a maioria das pessoas pode advir de questões
de cunho conceitual, de discussões teóricas
que, em sua dimensão prática, ajudam a moldar
o mundo como é.
Um exemplo de grande importância é o que nossa
atual sociedade reconhece como natureza. Vejamos então
algumas questões para se iniciar a reflexão
sobre este tema.
Cada pessoa, dependendo de como vive, possui com a terra,
e, portanto, com a Terra, certo tipo de relação
e identificação, como nos mostra Carvalho: “Por
exemplo, se para um empresário de mineração
natureza é fonte de matérias-primas de onde
extrai a mercadoria com a qual obterá lucros, já para
o camponês, natureza é meio de sobrevivência,
ou, de outro lado, se para o especulador de terras natureza é investimento
imobiliário, já para os índios é um
espaço de vida que não se vende nem se compra.”.
Vemos então que o que chamamos de “natureza” é algo
socialmente, historicamente e geograficamente constituído.
Assim, existe uma visão do que seja natureza que se
tornou a mais usada nas sociedades ocidentais atuais: a de
que “natureza” é algo externo ao homem.
Um grande passo na direção de uma mudança
nas relações sociais (e, portanto, ambientais)
existentes é a percepção de que o homem é também
natureza, assim como o que ele produz. A natureza não
pode ser entendida simplesmente como o lugar onde os homens
moram e tiram as coisas para seu sustento, visão esta
muito disseminada como senso-comum, e que é um motivo
central no avanço das degradações ambientais
postas.
Humanidade e natureza são na verdade uma coisa só.
Podemos compreender então que quando um homem explora
outro homem, está explorando uma parte da natureza.
Provavelmente, estará também explorando o resto
dela, ou seja, tudo é explorado. Hoje isso se dá em
nome da acumulação capitalista, como veremos
em breve.
Portanto, essa compartimentação da natureza,
não só entre homem-natureza, mas entre todos
os seus elementos, que são vistos separadamente, como
matérias-primas cuja finalidade é servir à produção
de bens, é algo desenvolvido através da história
e das visões de mundo de cada sociedade. Gonçalves
nos mostra que “Toda sociedade, toda cultura cria,
inventa, institui uma determinada idéia do que seja
natureza.”.
Sobre isso, Carvalho diz: “a natureza sequer teria
sido reconhecida enquanto alteridade...distinta da dos homens,
se as relações sociais não tivessem
conduzido historicamente a esta separação entre
o “mundo natural” e o “mundo social”.
A visão de que o resto da natureza é inferior
aos humanos e que é nosso direito (e mesmo nosso dever,
em alguns casos) usá-la como quisermos pode ser facilmente
e constantemente encontrada em tradições muito
presentes até os dias atuais, como a tradição
grega, principalmente de linha aristotélica e a tradição
judaico-cristã, tanto no Velho, como no Novo Testamento.
Essas duas tradições acabaram se misturando
e seus ecos se fazem fortemente presente em todas as sociedades
ocidentais. Porém, a visão compartimentada
de mundo, como colocada acima, foi claramente posta como
corrente de pensamento a partir de Descartes e seus seguidores,
justificando assim, uma certa visão de mundo que viria
a ser dominante em praticamente todo o planeta, principalmente
no ocidente, sendo seguida ainda hoje, por muitos, como a
visão verdadeira de mundo.
Em seu livro Discurso Sobre
o Método, Descartes chega a dizer que aprendendo sobre
a natureza e sua força “...poderíamos
empregá-los da mesma maneira em todos os usos para
os quais são próprios e assim nos tornar como
que senhores e possuidores da natureza”.
A filosofia cartesiana enquanto modo de se compreender o
mundo baseado em uma visão mecanicista da natureza
foi altamente adequada, tempos depois, para o crescimento
da burguesia mercantil, quando tendo sido a natureza dessacralizada,
ou seja, tendo sido tirada a visão sagrada de mundo
colocada pela Igreja Católica na Idade Média,
foi possível passar a explorar a natureza de um modo
muito mais agressivo, sem culpas ou preocupações
de cunho metafísico, pois uma moralidade baseada no
temor a um deus que poderia se enervar com certos tipos de
agressão à sua criação não
mais era um grande problema, ao menos para a emergente burguesia.
Podia-se, então, compartimentar a natureza, esquartejá-la,
pois era algo morto, não mais habitado por deuses.
O século XIX reforçou a visão cartesiana
de mundo, pois foi o momento do nascimento das disciplinas
científicas como conhecemos hoje. Com a idéia
de que “natural” e “social” são
instâncias diametralmente diferentes da realidade,
são criadas as ciências ditas naturais e as
ciências ditas sociais, que aparentemente, assim como
postas para a sociedade pelos acadêmicos devotos desta
falsa divisão, são ciências que atuam
em campos totalmente diferentes, e deste modo, a idéia
de natureza como algo compartimentado e separado da humanidade
foi altamente reforçada. Assim, disseminado como senso-comum,
o conceito parece algo estático, indiscutível.
A simples idéia de que o que “todos” chamam
de “natureza” pode ser outra coisa que não
aquela que “todos” chamam aparentemente desde
sempre, parece ridícula e sem interesse para muitos.
Muito se diz hoje, principalmente por movimentos ambientalistas,
que o homem está destruindo a natureza.
Porém,
não se diz qual homem está destruindo a natureza,
nem o que se está chamando de natureza. Com certeza
não é o índio nem o camponês clássico
(não ligado ao sistema capitalista) que estão
destruindo a terra onde vivem e retiram o que é necessário
para suas sobrevivências. Quem destrói o seu
meio ambiente é um certo homem sob uma certa cultura,
que gera um certo conceito de natureza, que na prática é a
própria relação do homem com o resto
da natureza. No mundo ocidental moderno essa relação
pode ser entendida como o próprio modo de produção
capitalista.
Este modo de produção tende a separar cada
vez mais o homem dos locais onde se poderia retirar os elementos
básicos para sua sobrevivência, principalmente
no que se refere à sua alimentação.
Deste modo, estes homens não terão outra escolha
a não ser estarem subordinados ao capital, pois não
tendo como retirar diretamente da terra o necessário
para o seu sustento, faz-se necessário comprar os
alimentos, roupas e tudo mais o que for necessário
no mercado. Para se comprar necessita-se de dinheiro. Para
se ter dinheiro necessita-se de emprego. Com gente necessitando
de emprego para comer, o burguês pode explorá-los.
Com gente sendo explorada, produzem-se mercadorias que são
postas no mercado para que essas mesmas pessoas, impossibilitadas
de ter acesso direto a estes produtos, possam obtê-los
através de sua compra. Com isso gera-se um ciclo de
acumulação de capital.
Portanto, a questão central nas discussões sobre
impactos causados ao meio-ambiente não pode ficar simplesmente
no consagrado “o homem é mal e destrói
a natureza”. Há de se aprofundar esta discussão.
O fato é que o modo de produção a nós
imposto, o chamado Capitalismo, necessita imprescindivelmente,
para seu funcionamento, da exploração da natureza,
sendo natureza não só árvores, animais
não humanos, solos, águas, etc., mas também
os homens e suas sociedades. Tudo é explorado em nome
da produção de mais-valia como meio de acumular
capital.
Índice
O
Conceito de Natureza como forma de compreender a realidade
Sobre
os Movimentos de Proteção do Meio-Ambiente
Sobre
a “Libertação Animal” e o Veganismo
Conclusões
propositivas
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